Vereadora Tainara Andrade foi “censurada” pela Câmara de Carmo do Cajuru após críticas ao prefeito Vinícius Camargos feitas em discurso na tribuna.
A vereadora Tainara Andrade casou repercussão política em Carmo do Cajuru após a Comissão de Ética da Câmara Municipal aplicar uma penalidade de censura contra ela. O processo surgiu depois que o prefeito Vinícius Camargos apresentou uma representação por quebra de decoro parlamentar contra a parlamentar.
A denúncia se baseia em um discurso feito por Tainara em agosto, quando ela chamou o prefeito de “chulo, megalomaníaco, demagogo, desplicente, despreparado, incompetente, arrogante e prepotente”. Na ocasião, a vereadora afirmou que o gestor “demonstra diariamente sua incapacidade de conduzir a cidade com seriedade e compromisso”.
Para ela, um bom administrador deve “colocar o interesse público acima do ego, planejar com responsabilidade, cuidar do patrimônio comum e promover melhorias reais na vida da população”.
Autopromoção
Segundo a vereadora, o prefeito age com vaidade e pensa apenas em autopromoção. “Enquanto a prefeitura torra mais de um milhão de reais em rodeio, as praças públicas seguem abandonadas”, denunciou. Ela destacou que o gestor “prefere gastar em festa passageira para se autopromover, mas não tem a menor preocupação em cuidar do que é de todos”.
Tainara também questionou a organização dos eventos realizados pela administração. Ela afirmou que até mesmo o rodeio promovido pela prefeitura, “milionário e com entrada franca”, apresenta falhas graves. “Se é um evento que pode gerar uma multidão, precisa garantir segurança à altura. Mas o que se vê é improviso e risco”, criticou.
Em tom de indignação, a vereadora classificou o governo municipal como “a gestão do espetáculo”. Segundo ela, o prefeito “investe pesado em palco, som e camarote, mas vira as costas para a comunidade”. Tainara ainda declarou que o atual governo “prioriza holofotes e ignora o básico, abandona o povo e expõe a cidade ao ridículo”.
A parlamentar encerrou seu discurso com palavras fortes: “Não administra, encena. Não cuida, explora. Não governa, maltrata”.
Quebra de decoro
Na última semana, Tainara utilizou as redes sociais para atualizar seus seguidores. “O gestor municipal protocolou contra o meu mandato uma representação por quebra de decoro, alegando descumprimento de normas éticas”, disse. Segundo ela, os três integrantes da Comissão de Ética, Marcelo Eletricista (presidente), Bruno (relator) e Sérgio Quirino (membro) decidiram de forma unânime que sua fala infringiu o Código de Ética.
A vereadora criticou a decisão e anunciou recurso. “Para mim, essa decisão é inconstitucional. Eu falo como advogada e afirmo isso com propriedade. Vou recorrer ao plenário e quero que todos os vereadores se manifestem”, afirmou.
Tainara reforçou que o recurso representa mais do que uma defesa pessoal. “A minha defesa não é da Tainara, é do Poder Legislativo, do direito de voz e opinião de todos os vereadores. Não podemos permitir precedentes que limitem nossa atuação parlamentar”, declarou.
Ela também denunciou o que considera uma tentativa de censura. “Eles estão me censurando por escrito. Querem me impedir de opinar sobre o gestor municipal. Então, falarei sim, porque o vereador tem o dever de defender suas prerrogativas constitucionais”, destacou.
Nota de solidariedade do PT
O Diretório Municipal do Partido dos Trabalhadores de Divinópolis divulgou uma nota em apoio à vereadora. O partido afirmou que Tainara foi “injustamente alvo de penalidade de censura” e classificou o processo como “nulo de origem”.
De acordo com o texto, o Código de Ética da Câmara determina que a penalidade de censura só pode ser proposta por vereador, cidadão ou partido com representação no Legislativo. “O prefeito, que se identifica como tal no documento, não tem legitimidade para oferecer a denúncia”, afirma o partido.
A legenda também apontou falhas na representação. “O documento sequer indica qual artigo do Código de Ética teria sido violado, carecendo de fundamentação mínima”, criticou.
O PT defendeu que as declarações de Tainara fazem parte de sua função parlamentar. “As críticas políticas da vereadora ao prefeito, feitas em 19 de agosto, integram o exercício legítimo do mandato. A Constituição Federal garante a imunidade das palavras, opiniões e votos dos vereadores”, diz o comunicado.
O partido denunciou o que considera uma interferência grave do Executivo sobre o Legislativo. “A tentativa de silenciar a vereadora configura grave interferência do Executivo sobre o Legislativo”, apontou.
O texto também condena a decisão do plenário que manteve a censura. “O resultado, por 7 votos a 1, representa um ato de covardia política contra uma parlamentar que cumpre seu papel de fiscalizar e questionar o governo municipal”, declarou o diretório.
O comunicado encerra com tom firme: “A voz da vereadora Tainara não é apenas dela, é a voz do povo que a elegeu. Calar Tainara é calar o povo de Carmo do Cajuru”.
Imunidade parlamentar e o dever do prefeito de suportar críticas: entenda o que diz a lei
A polêmica envolvendo a vereadora Tainara Andrade, de Carmo do Cajuru, reacende um tema essencial no Estado Democrático de Direito, os limites e garantias da atuação parlamentar.
No centro do debate está a imunidade das palavras, opiniões e votos dos vereadores, assegurada pela Constituição Federal e reafirmada por tribunais de todo o país.
O que é imunidade parlamentar?
A imunidade parlamentar é uma garantia constitucional prevista no artigo 29, inciso VIII, da Constituição Federal de 1988, que se estende aos vereadores nos limites do município. Esse dispositivo estabelece que os vereadores são invioláveis por suas opiniões, palavras e votos proferidos no exercício do mandato e na circunscrição do município.
Na prática, isso significa que nenhum vereador pode ser processado, punido ou censurado por declarações, críticas ou posicionamentos feitos no uso da tribuna ou durante a atuação legislativa, desde que as manifestações estejam relacionadas à função pública e à fiscalização do Executivo.
O Supremo Tribunal Federal (STF) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) têm reiteradamente decidido que essa imunidade é material e absoluta dentro do âmbito da atuação política. Ou seja, protege o parlamentar contra ações judiciais e medidas administrativas que busquem punir suas falas, mesmo que incisivas, quando dirigidas a autoridades públicas ou gestores.
Um dos precedentes mais citados é o Recurso Extraordinário nº 600063/PR, no qual o STF reafirmou que a imunidade parlamentar protege o vereador mesmo quando suas críticas são duras, severas ou impopulares, desde que vinculadas à atividade fiscalizadora.
Por que o vereador pode criticar o prefeito
A Constituição e as leis orgânicas municipais atribuem ao vereador a função essencial de fiscalizar o Executivo ou seja, controlar, avaliar e cobrar a aplicação dos recursos públicos e a conduta administrativa do prefeito. Essa função não é apenas um direito, mas um dever funcional do Legislativo.
Assim, as críticas e denúncias feitas por vereadores, inclusive em tom contundente, fazem parte da fiscalização política, protegida pela imunidade parlamentar. O artigo 31 da Constituição Federal determina que a fiscalização do município será exercida pela Câmara Municipal, diretamente ou com o auxílio dos Tribunais de Contas.
Logo, prefeitos, secretários e servidores públicos estão sujeitos à crítica política, pois ocupam cargos públicos e administram bens e interesses coletivos. O exercício de fiscalização implica, necessariamente, apontar falhas, denunciar omissões e cobrar transparência, ainda que de forma dura.
O STF também entende que o homem público deve suportar maior grau de exposição e críticas que um cidadão comum. No julgamento da ADPF 130, o Tribunal reforçou que “a liberdade de crítica é inerente à atividade política e indispensável ao funcionamento da democracia”.
Portanto, quando um vereador faz críticas ao prefeito sobre atos administrativos, gastos públicos, omissões ou decisões políticas, ele está agindo dentro de sua função constitucional e o prefeito, por sua posição pública, deve se submeter ao escrutínio e à crítica institucional.
Censura parlamentar é inconstitucional
Aplicar sanção disciplinar a um vereador por declarações feitas na tribuna fere frontalmente o princípio da separação dos poderes e a própria Constituição Federal. A punição de natureza política ou disciplinar só é cabível quando há desvio funcional comprovado, jamais por opinião emitida no exercício da função fiscalizadora.
Nesse sentido, decisões recentes do STJ (como no REsp 1.746.290/GO) reforçam que a imunidade material dos vereadores é cláusula pétrea, e sua violação configura ato de censura política.
Em resumo
- Vereadores são invioláveis por suas palavras, opiniões e votos proferidos na Câmara, conforme o art. 29, VIII, da Constituição Federal.
- Críticas ao prefeito fazem parte da função fiscalizadora do Legislativo e são protegidas pela imunidade parlamentar.
- Prefeitos devem suportar críticas públicas, por ocuparem cargo eletivo e exercerem função sujeita à fiscalização política.
- Censurar ou punir vereador por discurso político é ato inconstitucional e atentatório à liberdade de expressão.










